Elas enfrentaram a Inconfidência, o preconceito, a fome, a guerra e a ditadura. Algumas delas são mencionadas nas escolas e universidades. Outras não estão nas páginas de nenhum livro didático. Todas, porém, têm em comum o espírito de luta, a coragem de desafiar costumes e viver de acordo com os próprios critérios. Aqui, o Educação em Pauta lista algumas mineiras que, muito diferentes entre si, recorreram ao trabalho, à escrita ou à militância política como forma de desafiar a realidade que as cercava. São apenas seis entre uma infinidade de mulheres notáveis que fizeram a diferença na terra do pão de queijo, mas que, pelas suas diferentes naturalidades, origens e histórias de vida, expressam a força e o espírito imbatível da mulher mineira.

Bárbara Heliodora
Nascida em São João Del Rei, Bárbara Heliodora Guilhermina da Silveira (1759-1819) foi uma poetisa, mineradora e ativista política brasileira que, havendo participado da Inconfidência Mineira, foi a primeira mulher no Brasil a participar de um movimento político. Foi casada com o Inconfidente Inácio José de Alvarenga Peixoto (1742-1792), por quem se apaixonou aos vinte anos. Conta-se que a presença de Bárbara foi fundamental na vida do marido, havendo sido ela a acalentar o seu sonho de emancipação do Brasil. Em 1789, Alvarenga Peixoto foi preso e levado ao Rio de Janeiro, sendo, posteriormente, deportado para a África, onde faleceu. Ela, então, agora vivendo em São Gonçalo do Sapucaí, assumiu os negócios, administrando fazendas, lavras e escravos. A perda do marido e de uma filha deram origem a teorias, até então sem comprovação, acerca da suposta demência de Bárbara Heliodora. Sabe-se, porém, que a Heroína da Inconfidência veio a falecer em 1819, vítima de tuberculose.

Alzira Reis
Nascida em Minas Novas, Alzira Nogueira Reis (1886-1970) foi a primeira médica de Minas Gerais. Formada professora aos 16 anos, exerceu o magistério em Santa Cruz da Chapada, Minas Novas, Ouro Preto e Juiz de Fora, onde descobriu a vocação para a medicina. Assim, transferiu-se para Belo Horizonte e, em 1913, já frequentava a Faculdade de Medicina da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). No entanto, a mineira enfrentou diversos obstáculos para seguir com a sua formação, tais como a autorização do Ministério da Educação e os argumentos da direção da Faculdade, que, em virtude do necessário contato com os cadáveres masculinos nus, procurava dissuadi-la a cursar medicina. Alzira, porém, enfrentou o preconceito da faculdade, dos colegas, da sociedade e até da própria mãe, que não lhe dirigiu a palavra ao longo de seis meses. Ademais, devido à sua natureza independente e indomável, Alzira se envolveu em diversas outras polêmicas, tais como quando, por exemplo, se envolveu com um homem dezoito anos mais jovem, com quem veio a construir uma família, ou quando se envolveu na luta pelo direito ao voto feminino.

Iracema Tavares Dias
Em 23 de maio de 1935, pela primeira vez na história do Estado de Minas Gerais e na América Latina, uma mulher é nomeada ao cargo de promotor de justiça. Tratava-se da advogada mineira Iracema Tavares Dias (1912-2010), promotora de Justiça da comarca de Guaranésia, na Região Sul do estado. Nascida em Guaranésia, cidade fundada pelo avô, Iracema desde pequena se dedicava à leitura, brincando de discursar em casa já aos seis ou sete anos. Muito à frente do seu tempo, Iracema se dedicou à área de menores, transformando a sua casa numa extensão do gabinete, atendendo a menores e suas famílias. Após a morte do marido Mário Nardi, com quem casara-se em 1937, Iracema mudou-se para Belo Horizonte em 1951, quando foi promovida à terceira entrância. Em 1956, Iracema tornou-se a primeira curadora de menores no estado, cargo que exerceu até se aposentar, em 1967, e, mesmo após a aposentadoria, seguiu prestando auxílio às pessoas carentes que a ela recorriam.

Carolina Maria de Jesus
Carolina Maria de Jesus (1914-1977) foi uma escritora conhecida internacionalmente. Nascida na cidade de Sacramento, frequentou a escola por apenas dois anos. Havendo aprendido a ler e a escrever, Carolina se alternava entre o trabalho como catadora de papel e o registro da realidade dos pretos e pobres de sua época. Depois da morte da sua mãe, Carolina mudou-se para a capital paulista em 1947, momento em que surgiam as primeiras favelas na cidade. Dentre os vinte cadernos que ela reunia em sua casa com testemunhos sobre o cotidiano da favela, havia o que deu origem ao livro intitulado Quarto de Despejo, que vendeu 100 mil exemplares no Brasil e mais de 1 milhão no exterior. Periférica e mãe solteira, Carolina foi uma das primeiras e maiores escritoras negras da literatura brasileira, tendo publicado ainda Casa de Alvenaria: diário de uma ex-favelada (1961), Pedaços da Fome e Provérbios (1963) e Diário de Bitita (1986).

Carlota Mello
Nascida em Salinas, no Norte de Minas, em 12/10/1914, a mineira Carlota Mello foi uma das 73 enfermeiras brasileiras que serviram na Europa durante a Segunda Guerra Mundial (1939-1945). Única mulher entre oito irmãos, desde cedo Carlota era avessa ao destino de se casar e ter filhos, decidindo partir para a casa do irmão mais velho em Belo Horizonte e fazer o curso de normalista, uma das únicas funções permitidas à uma mulher naquela época. Ainda não satisfeita como professora, decidiu cursar enfermagem na Cruz Vermelha. O desejo de tornar-se útil e dar um sentido à vida foi o que levou Carlota ao chamado do Exército estampado em um cartaz, quando ela, jovem, atuava como enfermeira em Belo horizonte. Tornando-se arrimo de família ao retornar ao Brasil, a primeiro-tenente enfermeira se dedicou a cuidar dos pais e irmãos, optando por permanecer solteira e não ter filhos. Em 26/09/2012, Carlota foi homenageada na sede da Associação Nacional dos Veteranos da Força Expedicionária Brasileira (AnvFeb) pelo comando do 12º Batalhão de Infantaria (12º BI), subordinado à 4ª Região Militar (4ª RM). Carlota é a última mineira viva a participar da campanha brasileira na Itália.

Helena Greco
Nascida em Abaeté, na região Central do Estado, Helena Greco (1916-2011) se formou em Farmácia, sem nunca exercer a profissão. Foi na política que ela encontrou a sua verdadeira vocação, atuando na ditadura miliar pela defesa dos direitos humanos. Em 1977, aos 61 anos, se envolveu na defesa de presos e torturados políticos, recebendo diversos prêmios de direitos humanos no Brasil e no mundo. Foi eleita vereadora de Belo Horizonte em 1982. Muitos registros afirmam haver sido ela a primeira mulher a exercer um mandato no Legislativo em BH. A sua vida política foi sempre dedicada à luta contra as desigualdades. O antigo viaduto Castelo Branco em Belo Horizonte é, desde 2014, chamado de Elevado Dona Helena Greco, em sua homenagem.

Estas breves biografias nos mostram que, ao longo da nossa história, as grandes conquistas rumo à emancipação feminina se deram em virtude de movimentos feitos pelas próprias mulheres. Logo, é o protagonismo feminino, em conjunto com a tomada de consciência de toda a sociedade, que pode pôr fim às desigualdades ainda existentes.
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Fonte: sremetropb.blogspot.com.br
Texto: Alex Gabriel da Silva
Foto capa: Montagem

 

 

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